Livro ‘Trabalho Escravo Contemporâneo: desafios, invisibilidade e ações de enfrentamento em Sergipe’ foi lançado no Seminário, acesse o link e confira a publicação
Grandes nomes do combate ao trabalho escravo contemporâneo estiveram reunidos na manhã da sexta-feira, dia 11 de outubro, no Auditório do TRT da 20ª Região no Seminário sobre Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas.
O ministro Augusto César de Carvalho, a ativista, Diretora de Formação do Sindoméstico Bahia, e Doutora Honoris Causa pela UFBA, Maria Creuza Oliveira, o professor de Direitos Humanos da UFRJ, padre Ricardo Rezende Figueira e o procurador do Trabalho Manoel Adroaldo Bispo foram os palestrantes convidados.
A liderança sindical que é referência nacional na luta contra a escravização de trabalhadoras domésticas no Brasil, Maria Creuza Oliveira contou um pouco de sua história. “Sou uma das fundadoras da Fenatrad, fundamos, no dia 13 de maio, o Sindoméstico Bahia, com a certeza de que ali estávamos criando a nossa verdadeira abolição”, afirmou Creuza.
Mulher negra, trabalhadora doméstica desde os 10 anos de idade e militante há mais de 30 anos, Creuza participou junto à ex-presidente do Sindoméstico/Se, Sueli (in memorian) da conquista da Convenção 189, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Genebra. Um importante conquista para trabalhadoras domésticas do Brasil.
“Sempre gostei de trabalhar, trabalhei muito como babá, e também fazia os outros serviços da casa, mas o que nunca aceitei foram as condições de trabalho: trabalhar sem folga, não ter direito ao salário, ficar no quartinho do fundo sem ventilação onde ficavam os brinquedos quebrados e tudo que não servia mais, essa falta de respeito, eu nunca aceitei”, declarou Creuza.
Segundo Maria Creuza é muito importante criar condições para que as pessoas resgatadas do trabalho escravo tenham perspectivas de futuro para que não atentem contra a própria vida ao sair do cativeiro.
“A trabalhadora doméstica gera lucro para o patrão porque dá condições dos patrões saírem para buscar suas riquezas. Enquanto isso a gente trabalha gerando lucro, saúde, educação, limpeza e bem estar para toda a família e até para os animais. A humanidade necessita aprender a ter este amor ao próximo, este respeito”, discursou Maria Creuza e foi aplaudida de pé por todo o auditório do TRT da 20ª região lotado.
Maria Creuza destacou a importância da educação histórica para as próximas gerações para mudar a realidade de discriminação, escravização e violências contra as trabalhadoras domésticas no Brasil.
EMBUSTE DO MITO DA DEMOCRACIA RACIAL
O ministro do TST, Augusto César Leite de Carvalho afirmou que o embuste do mito da democracia racial precisa ser esclarecido para que a escravidão deixe aceita socialmente e culturalmente.
“Nem em toda escravidão é obrigatório que a pessoa trabalhe sob ameaça. Aqui no Brasil havia o escravo de ganho sem feitor, sem a submissão à força e à chibata, sem a presença do capataz”, explicou o ministro Augusto César.
Sobre o que se considera hoje em dia, pela auditoria do Tribunal Regional do Trabalho, como condições análogas ao trabalho escravo, o ministro destacou que são condições precárias de alojamento, de acomodação, a denúncia de que os trabalhadores estão bebendo a mesma água servida aos animais; que a alimentação põe em risco a saúde e a dignidade à pessoa humana. Também é considerada condição análoga ao trabalho escravo a prática dissimulada de coagir a pessoa a realizar o trabalho degradante, ainda que não haja violência física.
O padre Ricardo Rezende Figueira, que viveu mais de 20 anos na região do Amazonas, relatou histórias dos vários trabalhadores que conheceu e que tiveram suas vidas destruídas pelo trabalho escravo dentro de fazendas na região Norte do País. Por sua militância contra a exploração do trabalho escravo, o padre Ricardo chegou a ser ameaçado de morte.
O professor da UFRJ, Ricardo Rezende, explicou que a maioria das pessoas recrutada para o trabalho escravo na região Norte vem da região Nordeste, onde conheceu a Dona Pureza cuja história deu origem ao filme Pureza. “A pessoa escravizada é uma vítima, mas a família toda sofre. A maioria das pessoas escravizadas no Pará vinha do Nordeste e permaneciam trabalhando nas fazendas num regime de escravidão por dívida”, explicou Ricardo.
Já em São Paulo, o padre Ricardo mencionou a existência de escravidão de estrangeiros, bolivianas e bolivianos, nas fábricas de tecidos, também escravizados por dívidas, e revelou as dificuldades para que este trabalho fosse reconhecido pela legislação como trabalho escravo.
De acordo com Ricardo Rezende, em termos de legislação, houve uma mudança grande no artigo 149 do Código Penal que apenas dizia que o trabalho em condições análogas ao trabalho escravo é crime, com penalidade de 2 a 6 anos, mas não explicava o que era análogo nem o que era escravo, então faltavam à polícia e às autoridades competentes a capacidade de agir. Também havia dúvida sobre a esfera de atuação da justiça em caso de crime de trabalho escravo, tratava-se de assunto da justiça local ou federal? A partir da definição destas especificidades, através dessa mudança no Código Penal foi a partir de 2003, o combate ao trabalho escravo no Brasil ganhou efetividade.
O Seminário também contou com a apresentação da coreografia ‘Resistência em Movimento’ dos bailarinos Laís Santana e Alexandre Santos.
TRABALHO ESCRAVO CONTEMPORÂNEO EM SERGIPE
Durante o Seminário foi lançado o livro ‘Trabalho Escravo Contemporâneo: desafios, invisibilidade e ações de enfrentamento em Sergipe’, coordenado pela professora Shirley Andrade, coordenadora do Getec, demonstrando a importância da produção de conhecimento a respeito do assunto em Sergipe, onde ainda não há uma contribuição efetiva sobre o tema.
Presidenta do Sindoméstico/Se e diretora da Central Única dos Trabalhadores (CUT/SE), Quitéria Santos trouxe uma comitiva de trabalhadoras domésticas para participar do Seminário.
“Estamos envolvidas no lançamento do livro, pois a pesquisa que a professora Shirley fez foi a partir do relato de trabalhadoras domésticas escravizadas, aquelas que os patrões negavam direitos e não pagavam o salário. Essa pesquisa é importante porque deu visibilidade ao trabalho escravo em Sergipe. O Seminário está sendo emocionante pela palestra da militante Maria Creuza Oliveira. Além disso, aqui conversamos com a ADUFS e com a Fundat sobre parcerias para a promoção de cursos destinados às trabalhadoras domésticas de Sergipe”, revelou Quitéria Santos.
A vice-presidenta da CUT/SE, Caroline Rejane Santos, também participou do Seminário e ressaltou a importância desta luta. “A luta contra o trabalho escravo contemporâneo se fortalece em atividades educativas como esta. A CUT quer somar sua força a todas as atividades de enfrentamento à exploração do trabalho escravo contemporâneo, seja no campo ou na cidade, as condições desumanas de trabalho não podem continuar a existir”, declarou Caroline Rejane Santos.
O Seminário foi realizado pelo TRT da 20ª Região, o Grupo de Pesquisa e Extensão em Trabalho Escravizado Contemporâneo (Getec/UFS), a Escola Judicial do TRT/SE (Ejud-20) e dos Programas de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem, de Equidade de Raça, Gênero, Diversidade e Trabalho Seguro, com o apoio do Grupo Interinstitucional da 20ª Região (Getrin-20), do Ministério Público do Trabalho (MPT), da AMATRA XX, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e da Polícia Federal (PF).
Seminário Trabalho escravo contemporâneo
Escrito por: Iracema Corso
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